David Teles Ferreira

aqui vou publicando o que vou escrevendo

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Sempre estrangeiro



Sentir-se sempre estrangeiro. Em todos os lugares. Mesmo em sua casa. Mesmo dentro de si. Principalmente dentro de si. Não reconhecer nunca quem o olha no espelho. Sempre a sensação de estar de passagem. De não pertencer a lugar algum. Ou pertencer a todos por igual. Um desconforto perene. De andar apertado na vida como quem usa um fato demasiado acanhado. Não é inquietação. É um sentimento de estranheza. Como quando se usa uma camisola que pica no corpo. É uma vontade permanente de saltar muros.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Os dias vão passando



Os dias vão passando indolentes. Num presente que é um futuro adiado. Ou pelo menos assim se espera. Não é um hoje mau. Apenas estranho, mais por falta de hábito do que por outra coisa. Não vive de passados, embora alguns ainda o belisquem. Sabemos que ainda falta muito caminho para que o amanhã seja o sonhado. E que nem tudo depende de nós para que assim seja. O que é o mais perturbador. São, no entanto, dias de permanente descoberta e aprendizagem. Tranquilos mas enriquecedores, a mais das vezes. Por isso parecem mais anódinos do que são na realidade, a placidez se possa confundir com apatia, o silêncio com dúvida. Há uma quietação, que é apenas tomar balanço, mas gera, por antítese inquietações e incertezas. A dificuldade de assumir a serenidade.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Dias de outono

Os dias vão ficando mais pequenos. Os nossos dias também. São os outonos que vão chegando. Antecipando o branco que irá chegar aos telhados e às cabeças. Não necessariamente por esta ordem. Mas o outono é apenas mais uma estação. Que terá de ser vivida com o ritmo e emoção próprios, mas vivida o mais plenamente que conseguirmos. Quantas vezes desperdiçando menos que na primavera ou no verão, já que começamos a sentir um sentimento de maior urgência. Que não podemos desaproveitar o sol. Que temos de saber utilizar o tempo mais sabiamente. E apercebermo-nos de que, ainda que com menos luz, os dias continuam a ter vinte e quatro horas.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A secura das palavras



Às vezes as palavras secam. Como as lágrimas. Ficam retidas num nó na garganta. Na imobilidade das mãos. Secam e ficam a turbilhonar cá dentro. Como se um vento agreste as espalhasse. Como ondas que na beira da praia não se aquietam. Não conseguimos juntar duas sem que logo se dispersem. Balbuciamo-las interiormente, como uma criança a começar a falar, tentando achar sentidos. Organizar pensamentos. Tentamos encontrar uma coerência na confusão de palavras que nos assola. E acabamos sem saber se a secura, a desordem das palavras, é causa ou consequência do nosso caos interior.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

As aves migratórias



Sempre invejei as aves migratórias. Que todos os anos levantam voo e zarpam em direcção a melhores climas e condições em viagens longas e duras. Mas que conhecem o prazer da luta e de enfrentar o desconhecido. Que variam de habitat e não se deixam a ficar a gelar as penas em Invernos frios e chuvosos. A viagem, mesmo que sempre para os mesmos sítios, nunca é igual. E nada ultrapassa o prazer de atingir horizontes longínquos.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Sou um barco



Sou um barco à deriva nas águas. Derivo por vontade própria e não por falta de velas e remos. Quero ver onde me levam os ventos e marés. Não me faltam provisões nem tempo. Assim, a praia a que aportar, será sempre um achamento. Partirei, então, dela, terra adentro, ao sabor dos caminhos e acidentes geográficos. Numa outra deriva. Numa outra viagem sem destino definido. Mas perpétuamente com o deslumbramento de acordar num novo dia. Eternamente com a emoção da descoberta.