A opinião era unânime.
Aquele homem era um cabrão. Um grande cabrão. E não, não tinha nada a ver com o
comportamento da mulher, até por que a não tinha. Era tão cabrão que nenhuma
mulher o tinha querido. O homem era simplesmente execrável. Abjecto. Infame. Um
grande cabrão, portanto. Tinha, ainda em idade de berço, mordido o bico da mama
em que mamava, magoando seriamente a mãe. Ainda gatinhava e já tinha
estrangulado dois dos gatos da família, só não tendo conseguido fazê-lo ao
terceiro porque o gato era tão mau como ele e o tinha arranhado seriamente e
chispava para o mais alto que conseguia sempre que o pressentia. O cachorro da
casa urinava-se sempre que o via e fugia de rabo entre as pernas. Mais tarde,
não havia empregada que aguentasse uma semana devido às suas tropelias. A mãe
tanto chorou por causa dele que acabou por definhar de tal maneira que, quando
finalmente entregou a alma ao criador, foi a enterrar num caixão que parecia de
criança. O pai tentou de tudo para o endireitar, desde rezas a sovas de
cavalo-marinho, mas sem nenhum resultado. Acabou por desaparecer e, ainda hoje,
há quem diga que foi o filho que o matou e fez desaparecer o corpo. Cresceu
selvagem e cabrão. Isolado de todos. Por vontade própria e porque todos procuravam
afastar-se dele o mais que podiam. Foi com alívio que a gente da terra percebeu
que se tinha ido embora. Só nessa altura as línguas se soltaram e as pessoas
começaram a evocar as memórias do cabrão. A contar umas às outras as cabronices
que ele lhes tinha feito ou de que tinham conhecimento. Nem se deram conta de
que ao tanto evocar essas lembranças o elevaram ao estatuto de lenda. E de que,
desse modo, embora ele se tivesse perdido pelo mundo e não mais dele houvesse
notícias, nunca mais se livraram do cabrão.
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