Só vivia romances literários. Tinha a cabeça cheia
de princípios éticos das novelas do século dezanove que enchiam as estantes das tias. Ou
então de romances de cavalaria, ignaro d.quixote de boné e botas de carneira, a
cortejar dulcineias nos intervalos das aulas. Até o erotismo lhe chegou por via
dos livros, comprados em alfarrabistas sombrios e lidos às escondidas. Por isso lhe veio o hábito de fazer de contas
que sabia coisas que de todo ignorava, buscando na conversa pistas que lhe
permitissem arremedar o diálogo. Tarde descobriu que as raparigas já não
gostavam de declarações de amor arrebatadas. Antes queriam alguém que lhes
apertasse a cintura, roubasse um beijo e desalinhasse os sentidos.
Como só vivia romances literários, e ainda por cima do século dezanove, perdeu a carruagem; ou parou no tempo, se preferires.
ResponderEliminarEle pode ter descoberto tarde que as raparigas já não gostavam de declarações de amor arrebatadas - o que me parece errado -, porque elas continuam a gostar de declarações de amor, sim. Sejam elas arrebatas ou não, com ou sem apertos de cintura, com beijos roubados ou não.
Se calhar, ele apenas descobriu as raparigas erradas...