Encontros

Levantou-se ainda escuro. Mesmo assim já rebolava no colchão nodoso há horas. Também, deitava-se com as galinhas, por isso o sono sumia-se cedo. E com a idade dela o sono já não era muito. Vivia sozinha desde que o seu Manel, que Deus tem, tinha ido morar no cemitério. Sentia e não sentia a falta dele. Era conforme. Nalgumas coisas sim, noutras nem por isso. Pelo menos agora fazia o que lhe apetecia quando lhe apetecia. Tomou um pequeno-almoço frugal de café e pão com manteiga. Embrulhou-se no xaile e saiu em direcção ao posto médico. Era dia de consulta lá na aldeia. E ela, mais religiosamente do que à igreja, não faltava nunca. Nem sempre ia ao médico. Por vezes ia só à enfermeira para medir a tensão. Quando chegou à porta do posto já lá estavam mais duas raparigas do seu tempo, como ela, também clientes habituais. Chegaram-se para o lado dando-lhe lugar no banco e começaram a conversar. Estava frio, mas estavam habituadas. Já tinham todas a sua dose de invernos. Aos poucos foi-se juntando mais gente, quase toda idosa, quase todas mulheres. A conversa estendeu-se a todos sobre os mais variados assuntos. Acabava por ser uma espécie de fórum da aldeia. Quando a funcionária chegou disse, como de costume, que não havia vaga para tantos. Ninguém arredou pé. Foram ficando, em amena cavaqueira trocando novidades. A enfermeira e o médico chegaram e lá foram sendo atendidos os que tinham vaga. Quando chegou a vez dela e a enfermeira lhe colocou o aparelho sentiu aquele bem-estar indefinível, que nem a si mesma confessaria, mesmo que o entendesse, que lhe causou o toque da mão de alguém. Fora dali, ninguém a tocava. E toda a gente, mesmo que o não admita nem a si próprio, necessita de sentir o tocar de outro ser humano. Saiu do gabinete e, como quase todos os outros, foi-se deixando ficar. Depois, mais perto da hora do almoço, lá foram regressando às suas casas. Ela foi das últimas. Nunca nenhuma daquelas pessoas, ela incluída, admitiria alguma vez que lá iam quase só pelo convívio que lhes proporcionava.