David Teles Ferreira

aqui vou publicando o que vou escrevendo

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Partilhas



Eram todos muito jovens, recém-chegados à idade adulta. Vinham dos mais diversos pontos do país. Tinham-se conhecido, por acaso, naquela aldeia à beira-mar onde tinham ido veranear, por frequentar a mesma “tasca”. Uma empatia, que não sabiam explicar, os tinha unido quase desde o primeiro dia e autodenominavam-se, orgulhosamente, “brigada do desassossego”. Talvez, também, por uma certa antítese, que não antipatia, por outro grupo de frequentadores mais antigos mas nem por isso muito mais velhos. Passavam os serões em animados duelos de cantigas com o outro grupo, numa rivalidade sem acrimónias e em que a vitória nunca importava. A “tasca” tinha música ao vivo desde que os clientes cantassem. Só se juntavam à noite, no resto do tempo cada um fazia a sua vida. Com o aproximar do fim das férias chegou a véspera do dia em que a maior parte regressaria às respectivas terras. Resolveram, portanto, juntar-se antes de ir para a “tasca” numa sardinhada acompanhada de gaspacho. Reuniram-se no parque de campismo onde a maior parte estava alojada e começaram os preparativos. A parte das sardinhas foi fácil. A logística do gaspacho foi mais difícil mas foi sendo resolvida com desembaraço. Um alguidar de plástico foi a taça, um frasco de compota fez de pilão para moer o tomate com o sal e o alho, o pepino e o pão partidos a preceito. Quando foi para juntar o azeite é que foram elas, não havia. Alguém se lembrou então de uma solução. Pegaram num copo e foram pelas tendas próximas pedir um pequeno gole de azeite a cada vizinho. Claro que a segunda pessoa a quem pediram lhes quis logo emprestar a garrafa para que se servissem do que quisessem, mas recusaram delicadamente e explicaram que só queriam mesmo um bocadinho, para todos pudessem dar. Assistiu-se então a um comovente momento de partilha em que toda a vizinhança participou oferecendo um pouco do seu azeite. Quando chegavam junto das tendas já estava alguém preparado, de garrafa na mão, para fazer a oferta. Chamavam-nos daqui e dali. E o copo acabou por ser pequeno. É tão bonita a partilha quando é feita com o coração. Ninguém ficou mais pobre, mas todos ficaram mais ricos.

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